domingo, 9 de agosto de 2009

O Preconceito Nosso de Cada Dia

Até tentei não comentar toda essa atenção que o Danilo Gentili chamou ao twittar uma piada que foi logo classificada de racista pelos cyber-militantes de plantão, primeiro porque eu não consigo deixar de pensar que o óbvio objetivo do cara - ora, chamar atenção - está sendo ainda mais endossado pela própria avalanche de críticas, e depois porque a primeira coisa que eu pensei foi "cara, mas esses paulistas são todos preconceituosos, mesmo...".

E, no fundo, o problema de verdade é que é a gente que não sabe lidar com preconceito ainda. Por mais que nós achemos que os negros são ignorantes, que os cariocas são folgados, que os gays são promíscuos, que os baianos são preguiçosos, que os advogados são ladrões, que os argentinos são arrogantes, que os crentes são bitolados e os paulistas preconceituosos, nós somos educados a fingir que temos a mente aberta e ser condescendentes com os outros pra aproveitar a condescendência dos outros com nós mesmos. Porque "preconceito só eles têm; nós temos opinião bem formada sobre as coisas".

Ora, preconceitos todos temos. E o fato de tê-los não é ruim em si mesmo, e sequer evitável: é fruto da condição humana em sociedade. Aí, quando alguém vence a barreira hipócrita de silêncio e fala o que realmente pensa - e o que um monte de gente pensa, na verdade - as pessoas reagem, reclamam e criticam mais pelo medo da constrangedora reação em cadeia que a sinceridade costuma provocar (oh, que perigoso seria se todo mundo começasse a falar verdadeiramente o que pensa!) que por revolta pelas consequências que a manifestação de preconceito causou.

Até o Ministério Público de São Paulo pensou em processar o cara por racismo. Sério, vamos, antes de mais nada, considerar a pouca significância do caso, e depois considerar que o discurso é muito diferente da prática. A diferença entre discriminação e preconceito é que a primeira é a filha rebelde do segundo; é discriminação quando um pai proíbe que a filha loira namore com um negro só por preconceito, por exemplo. E é aí que a coisa fica séria de verdade.

Agora, sejamos francos. Aceitar esmolas de cotas raciais nas universidades públicas em vez de exigir segurança e boa educação de base para as camadas menos favorecidas da sociedade, reclamar de piadas preconceituosas em vez de fazer alguma coisa pra mudar a origem do preconceito está longe, e MUITO, de fazer alguma diferença contra a discriminação.

Eu sou negro e não me ofendo com a piada do Gentili, simplesmente porque não me enxergo no estereótipo que a motivou. E ainda acho que a galera que se ofendeu, direta ou indiretamente, podia trabalhar a auto-estima e rever os auto-preconceitos, fazer diferença pra mudar de vez o preconceito nosso de cada dia.